Ato no vão-livre do Masp faz reflexão sobre casos de estupro no país Elaine Patricia Cruz/Agência Brasil |
A manifestação relembrou o caso de quatro adolescentes, com idades entre 15 anos e 17 anos, que foram estupradas por cinco homens e depois jogadas de um penhasco na cidade de Castelo do Piauí há exatamente um ano. Uma das jovens morreu.
O evento foi convocado pela jornalista Giovanna Prado, 24 anos, com o objetivo de refletir e combater a "cultura do estupro no país". “Todo dia há uma manifestação diferente [no centro de São Paulo]. Todo dia alguém interdita a via e já não se sabe mais que protesto é. A sensação que eu tenho é que isso já não está mais impactando na vida de ninguém. Ninguém mais pára para refletir e ver o que está acontecendo. Pensei em uma forma para as pessoas refletirem sem que isso atrapalhasse seu cotidiano”, disse à Agência Brasil. “A ideia é aproveitar o espaço público, usá-lo como discussão para que as pessoas venham, se conheçam, conversem e deixem mensagens no mural, flores ou apoio”, afirmou.
Para Giovanna, o combate ao estupro é algo bastante complexo, mas deve começar pelo reconhecimento do feminismo. “Feminismo não é uma palavra ruim. É questão de igualdade. Eu, como mulher, exerço a mesma função e não ganho o mesmo. Eu, como mulher, saio na rua e sofro assédio. É isso que precisamos combater”.
Ela também acha importante que os pais conversem sobre o assunto com seus filhos, e que isso também seja objeto de discussão nas escolas. “Eu tinha 12 anos quando sofri o meu primeiro assédio. Não há idade para falar com as crianças. Elas precisam [saber sobre isso] até mesmo para se prevenirem e para formarem uma opinião. Aquele menino com quem você fala que isso não é normal e que uma moça pode andar do jeito que quiser, e que isso não dá o direito dele fazer nada com ela, ele vai aprendendo enquanto é pequeno. Estupro não pode ser um tabu: ninguém fala, as pessoas esquecem e ele continua acontecendo. A ideia aqui é fazer as pessoas refletirem. E isso deve ser feito todos os dias”, disse ela.
Repúdio ao estupro
O ato chamou a atenção de várias pessoas. Alguns pararam para escrever frases; outros, apenas para fotografar; alguns para refletir. Pouco a pouco, a parede foi ficando repleta de frases como: “Precisamos falar sobre a cultura do estupro”, “Ela era criança”, “Não ensinem mulheres como não serem estupradas. Ensinem homens a não estuprar”.
A professora Maria de Lourdes Teixeira da Silva, 53 anos, passou pelo local e aproveitou para fotografar e postar a foto nas redes sociais. "O povo está pondo e expondo. O que incomodou está lá, disse ela, apontando para as frases na parede. Não escrevi, mas tirei a foto e vou postar no meu Facebook. Bonita campanha”, disse.
Adilson Antonio Machado, 46 anos, que faz pequenos reparos, escreveu a frase “Prá que isso? Chega”, que depois foi afixada na parede. “A mulher não tem que ficar à direita ou à dianteira [do homem], nem nada. Tem que ter um patamar de igualdade”, afirmou. Machado achou “absurdo” o estupro da adolescente no Rio de Janeiro. Para ele, os homens responsáveis pelo estupro precisam responder pelo crime. “Eles tem que ser julgados”, ressaltou.
O casal Bruno Mourão Guzzo, 27 anos, jornalista, e Jéssica Policastri, 25 anos, educadora, estavam passando pela Paulista com duas afilhadas quando viram o ato no Masp e decidiram parar. “Acho fundamental. Todas nós mulheres estamos com esse grito entalado dentro da garganta”, falou Jéssica. “Estando com duas crianças, mulheres, penso em tudo o que elas podem passar e tudo o que podemos fazer, juntos, para que a vida delas seja diferente da nossa”, ressaltou a educadora.
“Acho que é uma coisa que está enraizada na cultura do brasileiro. Vivemos em uma sociedade totalmente machista e quando rompemos isso, é sempre de uma maneira hipócrita. Acho que o papel dos homens é pedir desculpas para as mulheres por todo o mal que possam ter causado a elas. E os homens que têm consciência, [precisam] abrir os espaços, que são privilégio sempre dos homens, para as mulheres, e deixar que elas falem, se empoderem e combatam esse machismo”, disse Guzzo.
Para Jéssica, o combate ao estupro só pode ocorrer “com muita luta”. “Com muita luta de todas nós, mulheres. E dos homens também, que podem colaborar. Que a gente não desista”.
Elaine Patricia Cruz – Repórter da Agência Brasil Edição: Maria Claudia