Com fundo partidário bloqueado, PSDB de SP fala em 'dízimo' para cobrir rombo de R$ 17 milhões

Estadão Conteúdo



A empresa Campanhas Comunicação Ltda., do jornalista Luiz González, responsável pelas campanhas presidenciais do PSDB em 2006 e 2010, cobra do partido na Justiça uma dívida de R$ 17 milhões referente aos serviços prestados em favor do hoje senador José Serra na disputa pela Prefeitura de São Paulo, em 2012. A ação foi iniciada em setembro, depois que o presidente estadual da legenda, o deputado Pedro Tobias, eleito para o cargo em julho, decidiu não cumprir um acordo verbal fechado com a gestão anterior, que pagaria a dívida em 25 parcelas.

O valor original das notas era de R$ 8 milhões e chegou a R$ 17 milhões devido a multas, atualização monetária, juros de mora e honorários advocatícios. O dirigente reconhece a dívida, mas alega que a sigla está enfrentando uma grave crise financeira e com dificuldade até para pagar funcionários e o aluguel de sua sede. "O problema é que não temos dinheiro para pagá-lo. Estou com o Fundo Partidário cortado até julho do ano que vem. O trocadinho que estamos gastando agora é o que sobrou da campanha do Geraldo (Alckmin) para governador", disse Tobias. Procurado pela reportagem, o marqueteiro preferiu não se pronunciar.

Já em 2012, quando presidia o partido pela primeira vez, o deputado tentou impedir que o diretório estadual assumisse a dívida da campanha. "Essa dívida não é do estadual, é de campanha municipal. O diretório não devia ter assumido", afirmou. Em caráter reservado, ex-integrantes da direção tucana reconhecem que havia sido feito um acordo com o marqueteiro.

A "penúria" do partido, segundo Tobias, se deve a erros contábeis em prestações de contas que levaram o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) a proibir o diretório estadual de receber repasses do Fundo Partidário do PSDB nacional, no início da década de 2010. "Prevejo muito pouco dinheiro na campanha do ano que vem. Quem doava ou está preso ou está quebrado. Ninguém vai ajudar a gente. Quem vai pagar a campanha de TV na capital? Caixa 2 é perigoso", declarou Tobias.

O assunto da dívida foi tratado em um encontro entre Tobias e o secretário de Transporte e Logística de São Paulo, Duarte Nogueira, ex - presidente do PSDB paulista. Ao ser questionado sobre o tema, o atual dirigente afirmou que o partido teria de demitir funcionários e corria até o risco de ser obrigado a deixar sua sede, um casarão na Avenida Indianópolis. No final da conversa, Tobias acrescentou que esperava "a qualquer momento" a visita de um oficial de Justiça.

O imbróglio acabou gerando um mal-estar entre o diretório nacional do PSDB, presidido pelo senador Aécio Neves (MG), e o braço paulista da legenda. "Tendo aumentado em três vezes o Fundo Partidário do diretório nacional, seria razoável que eles colaborassem com São Paulo à altura da importância do partido no Estado", comentou Luís Sobral, tesoureiro da campanha de José Serra em 2012.

"O serviço foi efetivamente prestado, por isso contamos com a ajuda do nacional para pagá-lo", completou Felipe Sigollo, tesoureiro do PSDB paulista à época. Como estão impedidos de transferir recursos do Fundo Partidário, a "colaboração" poderia acontecer com pagamento de fornecedores ou até mesmo do aluguel da sede em São Paulo. O diretório nacional preferiu não se pronunciar sobre o assunto.

Essa é a terceira vez que González aciona a Justiça para receber dívidas de campanha. A cinco meses do início do período eleitoral gratuito no rádio e na televisão de 2014, o PSDB recebeu uma cobrança de R$ 8,7 milhões que opôs Aécio e Serra. O valor era a atualização de uma dívida que o marqueteiro cobrou na Justiça por trabalho prestado à campanha de Serra à Presidência em 2010. Esse déficit foi pago em 12 prestações, sendo que a última parcela estava prevista para ser paga este mês, cinco anos depois. A outra dívida, de R$ 4 milhões, se referia à campanha de 2006 e já foi paga em 2010.

Diretório municipal vai cobrar ‘dízimo’ dos filiados

O presidente municipal do PSDB decidiu apelar para uma estratégia "petista" que nunca foi usada pelo tucanato: a cobrança de um "dízimo" mensal dos filiados do partido na tentativa de tirar a legenda do vermelho. A dívida do diretório paulistano do partido é de R$ 200 mil. O recolhimento servirá para pagar despesas básicas de funcionamento da sigla, como aluguel da sede, pagamento de funcionários, advogados e contador, além de financiar o processo das prévias que escolherão o candidato à Prefeitura de São Paulo em 2016.

"Temos que preparar as prévias e não temos dinheiro. Em 2012, elas custaram R$ 300 mil. Por isso, no ano que vem, vamos propor que os filiados contribuam, o que não é uma tradição do partido", disse o vereador Mário Covas Neto, presidente do PSDB paulistano. Os tucanos estimam um gasto de cerca de R$ 250 mil na realização da disputa interna, marcada para o fim de fevereiro. Segundo ele, o assunto será discutido durante reunião da Executiva do partido no dia 11 de janeiro. "A ideia original é que o filiado pague uma contribuição conforme sua taxa de renda", detalhou o dirigente.

O ex-tesoureiro do PSDB paulista Felipe Sigollo ratifica a medida. "Acho uma decisão mais do que justa. A cobrança foi algo que sempre defendi, mas nunca aconteceu", afirmou. Segundo Sigollo, o diretório municipal do PSDB não tem nenhuma fonte fixa de recursos. "É uma tradição o presidente do partido ir atrás de doações e promover jantares." São raros os casos, diz, até de parlamentares que contribuem com regularidade para os cofres do PSDB. No PT, por exemplo, os filiados com cargo público e eletivo são obrigados a pagar uma taxa fixa mensal.

Para o ex-deputado José Aníbal, presidente do Instituto Teotônio Vilela, do PSDB, a ideia é "simpática", mas ele prevê que haverá resistência interna. "O partido precisa encontrar meios de pagar as suas contas", disse. Ele é um dos pré-candidatos do PSDB à Prefeitura de São Paulo.

Antes do "dízimo", o PSDB paulistano havia causado uma polêmica interna ao cobrar uma taxa de R$ 20 mil dos interessados na disputa à vaga de candidato municipal. Os dois inscritos, até o momento, Andrea Matarazzo e João Doria, pagaram o valor.