Leitura e reflexão: CBD, uma criança esperta, linda e meiga.

Foto: Verdade na Prática


CBD, uma criança esperta, linda e meiga 


Há quase dois anos, passava eu pelo playground do prédio em que habito, quando lá me deparei com uma miúda de gestos graciosos a conversar com a tia-avó materna. Não a podia ver de frente. O meu ângulo de visão permitia-me tão só vê-la de costas. O seu belo cabelo comprido, preso numa fita elástica, comprimia-se num denso feixe acima da nuca, de onde pendia generosamente para trás no formato de um longo rabicho. Enquanto dialogava com a tia-avó, alternava-se ritmicamente em concentrar num único pé o peso total do corpo, depois no outro, como se fora um pêndulo vivo a gingar ao compasso binário marcado por um metrônomo.

Imediatamente percebi que, considerada a mesma faixa etária, a pequena CBD tinha incrível identificação com a minha querida filha mais velha, Cyntia Magna, de saudosa memória. Quanta semelhança! Aproximei-me da pequena, elogiei-lhe a beleza, conversei com a sua tia-avó, e prossegui em frente a cumprir a minha missão.

Se com essa garotinha tive uma empatia à primeiríssima vista, a recíproca parece ter sido verdadeira. Sempre que me vê, corre para abraçar-me. Desde então tenho estreitado os laços afetivos, partilhando com a sua tia-avó e a sua avó, ambas do lado materno, as preocupações em torno dela, do seu desenvolvimento escolar e da sua saúde, e divertindo-me com as gozadas travessuras próprias de uma ativa criança de sete anos de idade.

Um dia, levei-a para um jantar na casa da minha filha remanescente. Tendo em conta que a pequena CBD é alérgica a alguns alimentos, vigiei-a bem de perto para evitar que se excedesse nas recomendações que me foram dadas pela avó. Lá para as tantas, ela quis comer algo duvidoso, o que me levou a condicioná-la:

– Só poderá comer isto depois que eu ligar para a sua avó.
Com rápido reflexo, ela disparou:
– Está à espera de quê? Ligue logo, meu filho!

Ela tem uma história pessoal bem peculiar. Com pouco mais de dois anos de idade perdeu a mamãe, brasileira de ascendência unilateral espanhola. Nasceu no Canadá e tem dupla nacionalidade: a brasileira e a canadiana. O seu pai é canadiano com raízes francesas.

Outro dia, a sua avó brasileira contou-me a sua arte mais recente. A pequena CBD estava à mesa a manipular algumas missangas. Uma dessas contas estava na boca, outra, no cabelo, várias, sobre a mesa, e por aí afora. De repente, o interfone do apartamento tocou. Antes que alguém o atendesse, ela antecipou-se:

– É pra mim!

Nessa altura, ao gritar com a bolinha na boca, deglutiu-a, dando início ao desespero familiar. A família é amiga de um médico que, entretanto, não está no Brasil. Acha-se no Canadá a cumprir um ciclo de residência médica conseguida exatamente por interferência do pai da CBD, que também é médico. Portanto, não se podia contar com ele. Várias ideias brotaram. Inicialmente, fizeram-na ingerir muita água. Depois, levaram-na a uma clínica para um atendimento emergencial. Nessa consulta, a esperta CBD decretou ao médico que lhe dava assistência:

– Quero uma ultrassonografia geral!

Ao enfatizar “geral”, girou o quarto quirodáctilo da mão direita a coreografar que o campo da imagem deveria abranger todo o seu corpinho de alto a baixo, dos pés à cabeça. Ela foi mesmo submetida a um exame de imagem, mas em vão. Não se localizou nenhum corpo estranho em seu organismo, sinal de que provavelmente ela já o tinha fisiologicamente expelido.

Na volta para a casa, a avó e a tia-avó concertaram realizar um exame direto ao cocó de CBD. Esse exame coprológico doméstico consistia em escarafunchar instrumentalmente o material fecal colhido, até resgatar-se a famosa continha engolida. Entanto, esta invasão indireta à intimidade infantil não contou com a sanção da dona do cocó, que foi taxativa:

– Se mexerem no meu cocó, não me abracem mais nem se aproximem mais de mim!
A bisavó, que a tudo ouvia, sugeriu o uso de luvas protetoras, que, por cautela, ainda poderiam ser metidas em sacos de plástico. Muito astuta, a pequena CBD aparentemente concordou em ir à sanita para mais uma sessão de evacuação; contudo, para não ser vigiada, fechou a porta e a trancou por dentro. Realizada a “operação”, acionou duas vezes o autoclismo, para assegurar-se de que tudo ficara bem limpinho. Na sequência, saiu e anunciou vitoriosamente à bisavó, à avó e à tia-avó:

– Já está, e não se fala mais nisto. Caso encerrado.

Dela tenho ganhado prendas em datas comemorativas, como no dia do meu aniversário e no Dia do Pai, com a devida anuência do seu genitor, um cientista com atividade em África. Há pouco mais de dois meses, nasceu-me a minha netinha Liz Magna. CBD intimou enfaticamente a avó a comprar um presentinho para a minha neta, e depois o guardou bem ocultamente guardado. E porque o presente estava intencionalmente “sumido”, fê-la comprar outro, para depois comentar alegremente com rima e tudo:

– Feliz é Liz, que de repente
Vai ganhar mais de um presente!

Ela é mesmo uma criança adorável, linda e meiga!



Autor: Magno Reis Andrade




Tambem publicado em:

Verdade na Prática 

wordpress

Cascais - Lisboa - Portugal

-----------------------------------

SIGA-NOS

Para seguir o Jornal da Cabriola e receber nossas atualizações clique na imagem abaixo:

Se não entrar CLIQUE AQUI